terça-feira, 30 de dezembro de 2008

O Menino de Gaza


Imagem em: www.rtp.pt/.../images/articles/379700/gazahp.jpg

Acordou estremunhado, com a mãe a chama-lo para o pequeno-almoço. Ainda nem o sol tinha nascido e este menino já se lavava e vestia para ir para a escola. Dias de Gaza não se compadecem com quem lá vive, duros e áridos como a paisagem, afiados como o aço das bombas, rockets, balas que são projectadas.
- Arafat já rezaste? Só podes começar a comer depois de rezar.
- Ó mãe, mas não é justo! O papá já está a comer e as manas também.
- Isso foi porque já rezaram...vá não faças birra e reza!
Arafat contrariado levantou-se, virou-se para Meca e começou as suas orações. Este era o filho mais novo do casal e o nome tinha-lhe sido dado em homenagem ao carismático líder Palestiniano.
- Já posso começar a comer agora!?
- Não sejas impertinente, sabes bem que podes.
Após o pequeno-almoço, recebeu um saco com o almoço, pegou na mala, despediu-se da família e dirigiu-se para casa do seu amigo Said (com que seguiria para a escola). O sol começava a nascer e o dia ia ganhando tons mais suaves quando deixaram a casa de Said, a discutir quem era o melhor jogador de futebol do mundo.
O bairro deles foi ficando para trás e aos poucos aproximavam-se de zonas mais destruídas. Buracos de balas e morteiros eram vísiveis em vários edifícios, carros carbonizados, ruas cheias de entulho e arame farpado, eram as marcas de uma zona massacrada por um conflito de seis décadas. Quando passaram o primeiro posto de controlo montado pelos soldados israelitas (uma vez que a escola estava situada no lado judaico da faixa de Gaza), discutiam de maneira tão acalorada qual o melhor Messi ou Ronaldo, que até os soldados se riram.
As horas do dia foram sendo desfiadas lentamente. De manhã aulas sem interrupções, apenas uma paragem já próxima do meio-dia para rezar e almoçar. A tarde essa, iniciou-se com a leitura do Corão, prosseguiu com escrita, paragem para rezar e acabou com o tradicional jogo de futebol com bola de trapos. No caminho de regresso já não havia discussão acesa, estavam ambos exaustos e só pensavam em chegar a casa e descansar. Antes do jantar ainda houve mais duas orações, trabalhos de casa e finalmente um pouco de tempo para brincar.
A família estava finalmente reunida à mesa, a comer animadamente quando se ouviu um primeiro estrondo. Um barulho ensurdecedor atingiu-os como uma onda de choque violenta, pela janela viram uma luz avermelhada e chamas a deflagrarem pelo céu da noite, que agora era menos escura.
O pai gritou de modo a fazer-se ouvir:
- Todos para o vão interior do quarto! Afastem-se das janelas e mantenham-se unidos!
A família correu para o local e os seus corpos que tremiam juntaram-se, de modo a protegerem-se uns aos outros. Porém de nada lhes serviu, passados poucos minutos o prédio foi bombardeado, incendiou-se e começou a desmoronar-se. Felizmente para eles passaram a ponte para o outro lado, quando um primeiro fragmento de calor e luz os atingiu e o pai ainda conseguiu articular.
- Foi uma estrela cadente meninos, Alá ofereceu-nos o ouro do céu...



Texto baseado na notícia:
“A aviação israelita voltou hoje a bombardear vários sectores do enclave palestiniano da Faixa de Gaza, no segundo dia de uma ofensiva que já provocou 280 mortos e 620 feridos.” (site da RTP)

1 comentário:

La Lésion d'Honneur disse...

Hi
Can you tell me who is the author of this photo ?
I'd like to use it in an exhibition but want to be sure the authot is ok !
Thanks