terça-feira, 19 de agosto de 2008

O Marinheiro que perdeu as Graças do Mar


Primeiro livro que li de Yukio Mishima, e pode-se dizer que foi um prazer ler um dos “descendentes” de Fiódor Dostoiévski. Denso, por vezes lírico e metafórico é um excelente retrato da espécie humana, neste caso recria um micro-cosmos especifico de relacionamentos pais – filhos (o que não altera a natureza que é intrínseca dos humanos).
Este livro e resumidamente (pois não quero retirar interesse à história, caso alguém decida ler o livro) conta a história de uma marinheiro que abandonou a sua vida passada e qualquer hipótese de glória, por uma nova com a esperança de assim ter a paz e a felicidade que todos buscam.
Sem mais considerações, que possivelmente iriam retirar interesse a quem de futuro se interesse especificamente por este livro, alguns excertos que para mim são mais marcantes:


“A morte ganhava raízes no momento do nascimento e o papel do homem, depois, consistia apenas em regar e cuidar dessa planta.”

“Um homem não é bastante pequeno nem bastante grande para vencer seja o que for.”

“(...) odiava as confidências que se fazem de sobrancelhas franzidas e que se destinam a enganar a solidão (...)”

“(...) no fundo, não pertencia nem à terra nem ao mar. Um homem que odeie a terra, talvez nunca deva deixá-la, a separação e as longas viagens marítimas levá-lo-ão a sonhar outra vez com a vida de terra, o absurdo de suspirar por algo que detesta atormentá-lo-á.”

“Para um homem fechado durante todo o tempo num barco de aço, o mar assemelha-se demasiado a uma mulher.”

“A natureza rodeou o marinheiro com todos estes elementos femininos e, no entanto, ele é mantido tão longe quanto um homem pode estar do corpo quente, vivo, da mulher.”

“Num relance viu quão delicado e fragrante um corpo é.”

“Nenhum adulto é capaz de fazer seja o que for, que nós não possamos fazer também.Há um selo enorme com a palavra «IMPOSSÍVEL» colado sobre este mundo.”

“O verdadeiro perigo é viver. Claro, aquilo a que chamamos viver é apenas o caos da existência, mais do que isso é o esforço de desmantelarmos tudo, a existência, até atingirmos um ponto onde o caos original é restaurado e buscar forças à incerteza e ao medo que o caos contém, para recriar a existência instante a instante. Não há trabalho mais perigoso do que este. Na existência em si não há o medo, ou a incerteza, mas é o viver que os cria.”

“Ser duma impiedade ímpar era um ponto de honra para todos eles.”

“O chefe sustentava a opinião de que nada havia de novo a descobrir no mundo(...)”

Tudo indicava que esta casa vazia tinha dado ao Chefe as ideias que tinha sobre o tremendo vazio do mundo”

“(...) o assassínio encheria essas cavernas do tédio quase da mesma maneira que uma racha ao longo da face dum espelho enche esse mesmo espelho.”

“Um gato era só um exterior; a vida tinha «posado» de gato.”

“Este rapazinho pretensioso e asseado movia-se com uma rapidez de animal que Ryuji nunca tinha visto.”

“(...) que no mar não havia Grande Causa nenhuma. No mar havia penas horas de vigia ligando as noites umas às outras, o tédio prosaico e miserável da vida dos presos.”

“(...)todos os dias se fazia o registo exacto dos caprichos do mar como compensação pelo facto de o homem ser incapaz de lançar ao papel os seus próprios estados de espírito.”

“(...) respirando-lhe o cheiro da carne (...)”

“(...) a escuridão espalhava-se por todas as superfícies e, alimentando-se das partículas duma coisa que ele nunca vira, o quarto era a coisa mais negra do mundo.”

“(...) o seu rosto era branco era mais uma janela aberta no interior escuro do automóvel.”

“(...) todos os cheiros pútridos que os homens de terra deitam, o fedor da morte.”

“Os pais são o mal em pessoa, carregam tudo quanto há feio no Homem.”

“Atravancam-se no nosso caminho ao mesmo tempo que procuram sobrecarregar-nos com os seus complexos de inferioridade, e com as suas aspirações não realizadas, com frustrações, ressentimentos, ideais, as fraquezas de que nunca falam a ninguém, e os pecados, e os sonhos mais doces do que o mel, e as frases feitas por que nunca tiveram a coragem de pautar as suas próprias vidas.”

“A consciência dói-lhes porque nunca prestaram atenção aos filhos e ao mesmo tempo querem que os filhos compreendam a sua dor- que sejam compreensivos!”

“Um pai é uma máquina de escamotear a realidade, de servir mentiras aos filhos, e o pior não é isto: no íntimo, o pai acredita que representa a realidade.”

“Nós até deixamos comida cá fora para os ratos, para que eles não precisem de pecar a roubá-la.”

“O escuro transforma-se num olho imenso e sente-se como se estivesse a observar-nos.”

“Mas a memória da fúria do mar temperara-lhe não só as ideias sobre a terra e sobre os homens que vivem em terra, como a sua maneira quase instintiva de encarar os problemas.”

“Permitir, autorizar, é um privilégio nosso e se sentíssemos o mínimo de piedade, não seríamos suficientemente duros para permitir fosse o que fosse.”

“Transformou-se na pior coisa à face da terra: um pai.”

“Todos nós sabemos que o mundo é vazio e que o importante é tentar manter a ordem neste vazio.”

“Eles julgaram que, pelo facto de se terem atado com uma corda, tão fortemente que nem se podem mexer, nos impediriam também a nós de fazermos o que quer que seja;”

“(...) o acto essencial que é preencher o vazio do mundo, a não ser que estejamos prontos a sacrificar as nossas vidas.E vocês podem ver que é absurdo que os executantes arrisquem as suas próprias vidas.”

“È preciso sangue! Sangue humano! Senão este mundo vazio definhará e secará.”

“A glória, como vós sabeis, é uma coisa amarga.”

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